sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Um parto que se come frio


Cabaço Gonçalves era um mouro muito do mequetrefe, e não se abstinha de pregar pilhérias e bangolefas em qualquer um que lhe chamasse a atenção.
Certa vez, entrou na taverna de Moses Grafitelli, um italiano toleirão e truculento, dono de uma voz gutural de alce-bíades em período de acasalamento e de uma munheca destruidora, com que, em um só golpe, era capaz de destroçar pavimentos inteiros de estacionamentos suburbanos. Mal assomou-se ao antro, proferiu em voz alta:

Quem planta columbas, há de dar razão a mim: não há nada mais lisonjeiro, que entrar aqui e balangar a piçanha em vossas fuças de merdinha, mostrando a vocês o quanto pafúncios vocês são. Agora que eu disse isso, o que têm a me dizer?

Nada foi dito em retaliação, entretanto. Havia uma espécie de luto entre os comensais, pela morte de Bucetinha Pico-de-Jaca, conhecida feladora de coveiros da região, que se confundira em seu último ato, boqueteando um defunto até ele morrer (morrendo ela também, mais tarde, de infecção cadavérica na garganta). Os convivas se limitaram a baixar as cabeças, comendo pãezinhos de pupunha e tomando gin aos bebericos.

Ferido em sua vaidade, por ser um indivíduo miserável de chato, o mouro tentou uma alternativa sórdida e desesperada: tomou uma clava burgúndia encostada à parede e a atirou contra Grafitelli, xingando-o de "baço brocha de um cataplasma".

Embora fosse treinado em diversas artes marciais, além de ser formado em malandragem, manha, punga e trato social com a patifaria, não pelas instituições consumadas e laureadas pelas convenções sociais e influência política intrínseca, mas pela vivência no submundo e anos de experiência com corjas, o bom taverneiro apenas olhou tristonho para a arma que o abalroou a testa, espalhando tufos de cabelos-carapinha e tecidos miolares pelo balcão do bar. O mouro, então, olhou a todos os presentes, com um olhar vitorioso e desdenhoso, apontando o dedo a cada um deles, antes de sair, cantando God Save the Inconnu for Life, na versão derviche.

Nada mais podia ser feito, a não ser comer mais um pedaço de pãozinho de pupunha, e derramar gin uretra abaixo, pra grande desespero das glandes, uretras e candirus de cada um daqueles pobres e derrotados homens de boa fé e ações estranhas diante de espelhos de lavabo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário